11 março 2006

Virações de março

Estações ficam fora da ordem quando vivemos numa cidade gigantesca, onde faz todo tipo de clima num dia só. Lá, perdemos a noção que nos embala desde a infância, quando a estabilidade das temporadas servem de base para uma vida estável.

Quando vejo esses dias de março, com um vento já quase frio (pelo menos aqui no norte da ilha), lembro que esse era o mês em que voltávamos ao colégio, depois do longo e interminável verão. Cheiro de livro novo, a agitação das aulas, a saída em algazarra e as primeira providências: camisa de manga comprida, um casaco leve, um gorro.

Era só avançarmos no outono para já sentirmos falta do verão, principalmente da liberdade, quando o que havia era o pé no chão, calção sem camisa, futebol até o campinho virar breu e nos orientarmos apenas pela bola branca que rolava embaixo do céu estrelado. Talvez o veranico, que pode cair em maio ou junho, seja isso mesmo: saudade do verão recente. Mas não podemos ainda ter esse tipo de sentimento, pois os dias anteriores foram de lascar: um mormaço tremendo.

Para não dizer que a falta de assunto nos leva a comentar o clima, digo apenas que março é o ano que se abre para nós como um livro de promessas. O que adiamos por puro deleite ou preguiça começa a tomar conta das nossas rotinas. Aquele livro enviado pela amizade distante, a história que ficou no meio e ainda não escrita, o passo para fazer da vida algo fora desse labirinto, tudo conta quando o tempo dá as caras com suas mudanças. Estamos concentrados para a Copa, tememos o início das campanhas eleitorais, perguntamos o que será da cidade que se transforma, do aperto e da vontade que temos de virar o jogo.

É assim mesmo o texto sobre qualquer coisa: conseguimos chegar à última linha sem acrescentar quase nada. Mas a conversa, no redemoinho das estações, é o hábito mais gratificante quando ainda temos uma civilização.

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