Há uma década, com o combustível mais barato e a agenda menos cheia, era hábito juntarmos um grupo de amigos para pegar onda fora da Ilha, geralmente no litoral sul do estado, onde as condições de surfe são melhores. Era o que chamávamos de "fazer uma barca". Lembro de uma vez que fomos em três para a praia do Silveira. Foi um daqueles dias clássicos de anoitecer dentro d'água e ver a lua nascer no mar. Já estava escuro quando voltávamos pelo acesso principal de Garopaba. Alguns km antes da BR-101, pegamos um atalho; uma estrada de chão, sem iluminação nem casas, margeada por vegetação, que liga as duas rodovias.
De repente o farol iluminou algo no meio da pista que nos fez parar. Um homem caído no chão. Lembro que me pareceu ter pelo menos uns 50 anos, estava vestido de forma simples, pensei ser um típico pescador da região. Tinha parte do rosto ensanguentado. Próximo à sua cabeça havia uma sacola, talvez uma daquelas de papel, de padaria. Também me recordo de um braço esticado e um pedido de ajuda, mas minha memória pode estar aumentando a história.
Meu primeiro pensamento: foi atropelado, vamos ajudar. O dono do carro, que voltava cansado no banco de trás, pensou diferente: "pode ser uma armadilha, um assalto, estamos no meio do nada". Devo acrescentar que ele morou a vida inteira em uma metrópole. Discordei em voz alta, mas percorri os olhos em volta, procurando sombras na escuridão. Estávamos mesmo isolados. Um dos dois sugeriu avisarmos a Polícia Rodoviária Federal na BR-101, alguns km adiante. Seguiu-se um breve dilema, eventualmente o amigo que dirigia obedeceu ao dono do veículo que ele tinha em mãos: desviou do corpo e tocou adiante. No posto, nosso motorista avisou o fato a um policial solitário. E voltamos para Floripa, eternamente ignorantes do que havíamos deixado para trás. Fomos covardes ou prudentes?
Naquela época não havia (ou pelo menos nós não tínhamos ainda) celulares. Será que a história seria diferente se tivéssemos? Você sairia do carro nessa situação?
21 dezembro 2005
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3 comentários:
Vocês fizeram o que acharam certo no momento. Sensatez ou covardia? Nunca vão saber. Nem sempre dá pra ter resposta pra tudo.
Oi Gustavo, se por um lado queremos ser solidários e humanitários, por questão de princípios, por outro temos que ser céticos e frios, por questão de sobrevivência. É realmente uma decisão difícil. Ces´t la vie monsieur... Abraço.
Oi Gustavo, se por um lado queremos ser solidários e humanitários, por questão de princípios, por outro temos que ser céticos e frios, por questão de sobrevivência. É realmente uma decisão difícil. Ces´t la vie monsieur... Abraço.
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